A Mulher é Rara
Posted by NãoSouEuéaOutra | Posted in Consciência , Corpo Mulher , Feminino , Literatura , Mulher , Psicologia | Posted on 11:44
A VERDADEIRA MULHER
“A Mulher é Rara”, de Louis Pauwels
- jornalista e escritor francês -
- jornalista e escritor francês -
"A verdadeira mulher, aquela que vem a nós do fundo das eras, a mulher que nos foi dada, pertence inteiramente a um universo estranho ao homem. Ela cintila no outro lado da Criação. Ela conhece os segredos das águas, das pedras, das plantas e dos animais. Ela fixa o sol e vê claro na noite. Ela possui as chaves da saúde, do descanso, das harmonias da matéria. (…) É ela que semeia o homem: volta a pari-lo, nele reintroduz a infância do mundo. Ela o devolve ao seu trabalho de homem, que é elevar-se o máximo possível acima de si mesmo”.
O problema é que quase não há mais mulheres. Sustento que as mulheres desapareceram, que houve uma catástrofe, que a raça das mulheres foi dispersada e aniquilada sob nossos próprios olhos, que não puderam ver. Senhores, a mulher, a descendente do paleolítico e do neolítico, nossa fêmea e nossa deusa, o ser que eu chamaria de mulher do homem e que já não sabemos como é, foi perseguida, atingida em seu corpo físico e em seu corpo mental, e devolvida ao nada.
As entranhas da Terra estão plenas de florestas tragadas, de restos de espécies animais desaparecidas, de cinzas de raças humanas e sobre-humanas cuja história, se nos fosse revelada, desafiaria a mais louca imaginação. Nossa verdadeira fêmea, ela também, misturou-se ao húmus dos abismos subterrâneos. Por quê? Ah, senhores, reflitam! Foi ela quem arcou com os custos da imensa, da implacável luta contra as religiões primitivas do Ocidente. Essa luta é toda a história do mundo dito civilizado. Os senhores acreditam que nos lugares onde as legiões romanas nunca conseguiram adaptar sua religião — por exemplo, na Gália ou na Grã-Bretanha —, os soldados de Cristo encontraram uma terra inculta e sem deuses? Em inúmeros lugares da velha Europa, nas landes, nas planícies de menires, no fundo do mato e nas margens dos rios onde Pã cantava, sobrevivia a religião nativa oriunda da noite dos tempos, a verdadeira religião do homem ocidental. Senhores, estou certo de que a Europa viveu, durante milênios, de um elevado pensamento místico, ele mesmo oriundo de outras eras, consagrado ao Deus Cornudo e à exaltação do princípio feminino. É evidente que essa espiritualidade original foi afogada com violência, no fogo e no sangue, por uma religião estrangeira, vinda do Oriente: o cristianismo. O Deus Cornudo, protetor da antiga humanidade do oeste, foi chamado de diabo e amaldiçoado.
Os ídolos imemoriais foram derrubados e foi preciso destruir, junto com eles, seu suporte: a mulher-mãe, a mulher-deusa, a mulher-fêmea, a verdadeira mulher.
As pessoas cultas denunciam hoje as atrocidades do colonialismo recente: os indígenas aniquilados, os feiticeiros africanos extintos, as civilizações negras martirizadas. Mas não falam de nossos antigos totens, que foram derrubados! De nosso Deus, que foi aviltado e perseguido! De nossas sacerdotisas, que foram exterminadas! De nossa mulher, que nos foi subtraída! A velha Europa também foi colonizada e desfigurada. Sim, senhores, ouso dizê-lo. Do ponto de vista puramente antropológico em que me situo, a história da Igreja cristã é a história de uma guerra empreendida pelo estrangeiro contra um culto nativo muito antigo, muito poderoso, muito profundamente arraigado e de um crime bem-sucedido contra toda a raça humana fêmea. Nós perdemos nossa metade, senhores. Como demonstrarei, ela foi morta.
Não acuso. Talvez esse crime fabuloso fosse necessário. E talvez fosse inevitável. A civilização não seria o que é se a verdadeira mulher ainda existisse. Nós continuaríamos a crer no Paraíso terrestre. O espírito humano não teria tomado novos rumos. Não estaríamos hoje a ponto de atingir as longínquas galáxias, não teríamos aberto as portas do universo, pelas quais já penetra o chamado do Deus último, no qual se fundirão todos os nossos deuses, no qual o espírito do globo se reabsorverá um dia, tendo cumprido sua missão. Mas examinemos esse crime. Extermínio físico em fogueiras: evocarei as centenas de milhares de verdadeiras mulheres, chamadas de bruxas e queimadas como tais, e os outros milhões de mulheres vencidas e transformadas pelo medo. Eu os remeto ao Michelet visionário de La Sorcière, livro admirável e incompreendido. Extermínio pela propaganda, arma mais certeira do que todas as outras, como já sabemos, e mais eficaz na época do que a polé e os borzeguins. Guerra revolucionária empreendida pela Cavalaria contra a mulher verdadeira, a favor de um novo ídolo. E, enfim, num plano mais amplo, mais misterioso e concomitante, mutação decadente da espécie. De tal forma que, pouco a pouco, o ser fêmeo autêntico foi substituído por um ser diferente.
Senhores, o ser que chamamos de mulher não é a mulher. É uma degenerescência, uma cópia. A essência não está aí, o princípio não está aí, nossa alegria e nossa salvação não estão aí.
(…)
Chamamos de mulheres seres que dela não têm senão a aparência, tomamos em nossos braços imitações de uma espécie inteiramente ou quase destruída.
A mulher é rara, disse Giraudoux. Ao desposarem uma medíocre falsificação dos homens, um pouco mais artificiosa, um pouco mais maleável, a maioria dos homens desposa a si mesma. É a si mesmos que eles vêem passar pela rua, com um pouco mais de colo, um pouco mais de quadris, o todo envolvido em seda; é a si mesmos que eles perseguem, abraçam, desposam. Afinal, é menos frio do que desposar um espelho. A mulher é rara, ela transpõe as enchentes, derruba os tronos, ela detém os anos. Sua pele é o mármore. Quando há uma, ela é o impasse do mundo… Para onde vão os rios, as nuvens, os pássaros isolados? Se lançar na Mulher… Mas ela é rara… Deve-se evitá-la quando a vemos, porque se ela ama, se ela detesta, ela é implacável. Sua compaixão é implacável… Mas ela é rara.
(...)
A verdadeira mulher, aquela que vem a nós do fundo das eras, a mulher que nos foi dada, pertence inteiramente a um universo estranho ao homem. Ela cintila no outro lado da Criação. Ela conhece os segredos das águas, das pedras, das plantas e dos animais. Ela fixa o sol e vê claro na noite. Ela possui as chaves da saúde, do descanso, das harmonias da matéria. É a feiticeira branca entrevista por Michelet, a fada de largos flancos úmidos e olhos transparentes, que espera pelo homem para reconstituir o paraíso terrestre. Se ela se der a ele, será num movimento de pânico sagrado, abrindo para ele, na quente obscuridade de seu ventre, a porta para o outro mundo. Ela é a fonte de virtude: o desejo que ela inspira consome a excitação. Mergulhar nela devolve a castidade. Ela é estéril, pois detém a roda do tempo. Ou, melhor, é ela que semeia o homem: volta a pari-lo, nele reintroduz a infância do mundo. Ela o devolve ao seu trabalho de homem, que é elevar-se o máximo possível acima de si mesmo. Dizem super-homem, não dizem supermulher, porque a mulher, a verdadeira, é aquela que faz o homem mais do que ele é. A ela, basta-lhe existir para ser, plenamente. O homem deve passar por ela para passar ao Ser, a menos que escolha outras asceses, onde ainda voltará a encontrá-la, sob formas simbólicas.
Senhores, descobrir a verdadeira mulher é uma graça. Não ficar assustado, outra. Unir-se a ela requer a benevolência de Deus… Que estranho encontro! Ela aparece bruscamente no rebanho das falsas mulheres, e o homem favorecido que a vê se põe a tremer de desejo e de temor.
“Tudo vai mudar, chega de jogar:
Vejo teus seios desabrocharem
E às vezes teu ventre fremir
Como um sol quente que se ergue,
Tu me aquietas e eu me admiro
Com esses poderes que deténs…”
O texto acima é uma Conferência Imaginária, entitulada “A Mulher é Rara”, de Louis Pauwels - jornalista e escritor francês que juntamente com Jacques Bergier escreveu “Les Matin des magiciens” (1960).
um trabalho de suor igualar-se a Mulher ou derrubá-la...
http://perfumedaestrelacintiathome.blogspot.com.br/
saudade...