A. M. Holmes
Em Setembro de 1997 encontrei um livro que me despertou a atenção, pela sua capa. Uma menina, cuja fotografia a preto e branco, contrastava com o fundo de cor açafrão. O titulo pareceu-me sugestivo, ''O Fim de Alice''. Abri o interior do livro, tentei logo procurar quem seria o autor do mesmo; deparo-me com uma bela fotografia do autor e, é uma mulher (fotografia acima). Vou ao prefácio e cai-me qualquer coisa da ficha mental. Terei de levar o livro. Antes ainda, abro a meio uma /duas página/s qualquer/es. Leio. Fico séria. «Isto não é para brincadeiras!», exclamo. Escrito por uma mulher, uma outra visão. Terei de comprar! Até que ponto esta narrativa irá...
Há bastante tempo, já desde o outro blog, que ando tentando colocar trechos do livro !! Resolvi, hoje, colocar o principio do livro!!
O Fim de Alice
Quem é ela para ter tão tormentoso vício, esse gosto estranhamente adquirido pela carne mais tenra, para contar uma história que fará com que alguns de vós esbocem um esgar ou um sorriso mas que deixará outros decididos e pôr termo a este pesadelo, a este horror. Quem é ela? O que mais o assustará é saber que ela tanto pode ser você como eu, um de nós. Surpresa surpresa.
E talvez se interroguem quem sou eu para estar a interferir, para agir como tradutor dela, e seu. Meu é o discurso, a cadência e consonância de um homem velho e estranho que está preso há muito tempo, punido por satisfazer um gosto muito próprio. Verdade seja dita que vejo nela as sementes da minha juventude e a lembrança de outra jovem que não pude deixar de conhecer.
Alice, entrego-vos delicadamente o nome dela, propondo que, se o conservarem cuidadosamente como eu, bem junto ao coração, talvez no fim disto tudo entendam como pode ser perturbador o bater de dois corações iguais e como por fim um deles teve de parar.
Nesta altura, quem me estiver a ler já sabe quem eu sou – e verá no meu disfarce a tonta e infantil senilidade da longa reclusão, da mente sã que apodreceu. Mas saibam também que, ao contar-vos isto, sinto-me como um concorrente de What´s My Line; diante de mim está o meu tribunal, os três membros do painel, vendados – este pormenor deve causar, em vós, uma certa excitação. Fazem-me perguntas sobre a minha profissão. A assistência olha directamente para mim e, reconhecendo o meu rosto dos retratos de má qualidade, fica totalmente perplexa. Sou o primeiro tarado, o primeiro amante de jovens, que têm no programa. Sinto-me honrado. Sensibilizado. Quando acho que ninguém está a olhar, acaricio-me.
E deixem-me que vos diga que tenho a mais profunda admiração e respeito pela jovem mulher em análise – pelas mulheres jovens em geral, quanto mais jovens melhor. ao cumprir a minha pena, tornei-me o principal correspondente, o conhecedor-mor, nestas questões. De longe sou procurado pelas minhas opiniões, pela minha experiência nestes assuntos. (…)
(...)E, para ser franco, não recebo muitas cartas de raparigas. Escrevo de imediato uma rápida nota introdutória, «Muito interessante. Por favor envia-me uma fotografia tua para me ajudar a entender melhor.»
Ela responde com uma nota. «Fotos um gaita. É algum tarado, ou quê?»
Apanhado outra vez. Reduzido à minha insignificância, posto no meu lugar.
«Sim, querida» rabisco, em resposta, num simples postal. (...)
A.M.Homes in ‘’ O Fim de Alice’’
História de obsessão sexual e desejo que, desafiando as convenções sociais, conduz o leitor a uma preocupante análise das suas próprias (in)definições, O Fim de Alice é o relato de um encontro entre um pedófilo, a cumprir o seu 23º ano de prisão pela morte de uma jovem de 19 anos. Com algo, inesperadamente, de comum, confirmado através da correspondência trocada entre ambos: a fatal paixão Alice e a doentia atracção por um rapaz de 12 anos. São, aliás, as cartas da jovem que irão evocando no narrador fragmentos dos seus crimes, designadamente os doentios acontecimentos de umas férias de Verão que, ocorridas nos anos de meninice, o hão-de transformar para sempre… até ao fim de Alice.
A. M. Homes, professora de Literatura na Columbia University, é um dos nomes mais brilhantes da nova geração de escritores americanos. Classificada de «hilariantemente perversa» pela critica americana, é autora dos romances Jack; In a Country of Mothers e The End of Alice e ainda o livro de contos The Safety of Objects. As suas obras estão traduzidas em dez línguas.